terça-feira, 25 de dezembro de 2018

SOBRE O SUICÍDIO PASTORAL



Pr. Reginaldo de Matos Araújo.

Em minha curta carreira pastoral, não presenciei tantos noticiários sobre suicídios de pastores como nos últimos cinco anos. Existe uma onda de desastre mortal que tem assolado esta classe de servidores do Reino.
Em tempos passados, morrer no/por causa do reino de Deus era motivo de honra. Alguns encaravam o martírio como algo digno e honroso, a morte, por trabalhar e se desgastar no serviço cristão era o triunfo do trabalhador do evangelho.
Em uma rápida passagem pela história da igreja, percebemos que a grande maioria dos líderes do primeiro ao quarto século foram perseguidos e mortos. A máxima destes líderes, era: Agradar a Deus e não a homens.
Vejamos alguns poucos textos bíblicos que balizavam estes servos e tiremos nossas conclusões:
"Porque, persuado eu agora a homens ou a Deus? Ou procuro agradar a homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo."  (Gálatas 1:10);
"Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus."  (Romanos 8:8)
"Ora, sem fé é impossível agradar-lhe; porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que é galardoador dos que o buscam."  (Hebreus 11: 6);
"Vós, servos, obedecei em tudo a vossos senhores segundo a carne, não servindo só na aparência, como para agradar aos homens, mas em simplicidade de coração, temendo a Deus." (Colossenses 3: 22)
"Não servindo à vista, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus;" (Efésios 6: 6);
"Mas, como fomos aprovados de Deus para que o evangelho nos fosse confiado, assim falamos, não como para agradar aos homens, mas a Deus, que prova os nossos corações."  (I Tessalonicenses 2: 4).
Não estou ignorando as lutas e desafios do presente século que assolam o pastoreio atual. Eu mesmo, reconheço que são muitas e grandes. Mas, também reconheço que vivemos em uma época de competição muito acirrada, onde, lamentavelmente, muitos líderes cristãos têm entrado nela.
A depressão também não pode ser ignorada, é, de fato uma realidade. Todavia, muitos dos fatores que levam a esta enfermidade tão desastrosa pode ser evitada com receitas antigas e boas. Principalmente por líderes cristãos.
Nesta época de isolamento, é preciso, ouvi o que os velhos conselhos de Richard Baxter[1] tem a nos oferecer.
Primeiro:[2] “[..] teremos oportunidade maior de impressionar o coração da pessoa a quem falamos a verdade quando nos dirigirmos à necessidade particular do indivíduo, dizendo ao pecador: "És tu o homem", como fez Natã, mencionando claramente seu caso particular, apresentando a verdade com conhecimento adequado. ”
Muitos vivem para impressionar, o título de pastor, é alto demais para se misturar com outros humanos, passam seus dias em busca de impressionar pessoas. Querem mostrar sua capacidade, seu trabalho excepcional, sua família disciplinada, seu carro semelhante ao do médico da igreja, do engenheiro, do empresário e assim por diante.
Seus diplomas precisam ter a mesma validade que os demais, chancela das grandes universidades, passeios dignos de “pastor”, conviver no mesmo ambiente que os demais da sociedade moderna e cosmopolita dos grandes centros urbanos convivem.
Qualquer coisa menor que isso é não está no centro do chamado de Deus. Os amigos são escolhidos a dedos e assim por diante. A lista não para e o sufoco aumenta.
Na ânsia de ajuntar pessoas e para não as perder, muitos ministros tem sufocado o ministério que Deus lhes deu. Assim, procuram agradar mais as pessoas que a Deus, não querendo falar a verdade para não as machucar. Com isso, vão sofrendo do que chamo de “atrofia pastoral”, sua autoridade vai sendo minada, sua razão de existir como guia do rebanho vai perdendo o sentido e sua caminhada vai a cada momento tornando-se em um amontoado de passos sem significado.
Segundo:[3] “[...] disponham-se unânimes à prática da disciplina da Igreja, a qual é, indubitavelmente, parte necessária de seu trabalho. Infelizmente, bons homens se acomodam e negligenciam tão grande dever. O clamor comum é: "Nosso povo não está pronto para isso; não suportarão a disciplina". Mas, de fato, não é verdadeiro que alguns pastores não querem sofrer os conflitos e os rancores que a disciplina poderia ocasionar? Se, na verdade, proclamarmos que nossas igrejas não são capazes de manter a ordem e o governo de Cristo, nada mais estaremos fazendo, senão entregar a causa aos que se nos opõem e encorajar as pessoas a procurar outras sociedades em que não sejam disciplinadas. ”
Toda a autoridade pastoral em relação a disciplina da igreja tem sido aos poucos usurpada. Disciplinar é palavra arcaica e sem sentido na conjuntura atual. Não são mais pastores, são coachs, são psicanalistas e coisa do tipo. Quando nossa autoridade de guias espirituais é tirada, nossa existência também não faz sentido.
Por fim:[4] Temos de ter uma atitude mansa e condescendente para com todos. Primeiro temos de dispor as pessoas ao aprendizado por meio do exemplo de nossa própria prontidão para aprender. Ensinamos e aprendemos ao mesmo tempo. Não deveríamos ventilar conceitos próprios cheios de orgulho, desdenhando os que nos contradizem, como se tivéssemos atingido o cume do conhecimento e nos assentássemos para ensinar o povo aos nossos pés. O orgulho é um vício que não cabe a homens que deveriam demonstrar humildade na condução de pessoas para o céu. Deveríamos cuidar que, conduzindo pessoas para o céu, a porta não seja estreita demais para nós mesmos. Como disse Grócio: "O orgulho nasceu no céu, mas, como se esquecesse que o caminho de lá se fechou, é impossível que ele para lá retorne". O Deus, que lançou do céu o anjo orgulhoso, não acolherá um pregador soberbo. Devemos nos lembrar, pelo menos, de que recebemos o título de ministro (servidor). A raiz do orgulho alimenta todos os demais pecados. Daí a inveja, as contendas, a falta de paz dos pastores; daí os impedimentos da reforma espiritual. Todos querem liderar, poucos aceitam seguir ou cooperar. Daí, também, a falta de proficiência de muitos ministros, pois são orgulhosos demais para aprender. A humildade lhes ensinaria outra lição. Digo, a respeito dos ministros, o que Agostinho disse a Jerônimo, falando sobre os mais idosos entre eles: "Embora seja mais aprazível aos idosos ensinar do que aprender, muito mais digno é aprender do que permanecer ignorante".
É lamentável, quando chegamos em nossas convenções, retiros, grupos onde existem muitos pastores, ao invés de encontrarmos um ambiente de liberdade, fraternidade e mansidão. Encontramos homens e mulheres orgulhosos, arrogantes, olhando por cima, procurando onde estar um “pastor menor”, a razão? Revelar que sabe mais, que pastoreia melhor, que ganhou mais almas, que tem uma igreja maior e assim por diante.
Mesmo que tais indivíduos, estejam totalmente destruídos por dentro, não se curvam, não choram, não se humilham. O resultado geralmente é trágico. O presente texto não pretende ignorar a realidade individual e as lutas internas que cada líder enfrenta, apenas convidar a uma reflexão. Pense nisso.
Pirenópolis, Goiás, 25/12/2018.


[1] BAXTER, Richard. Manual Pastoral de discipulado. São Paulo; Cultura Cristã, 2008.
[2] Ibidem, p.152
[3] Ibidem, p.30
[4] Ibidem p.97

Isaías e o seu tempo, nós e nosso tempo. Como vamos reagir?

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