sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Ministério pastoral e a bivocacionalidade.


Pr. Reginaldo de Matos Araújo.
Ministério bivocacional, fazedores de tendas, dupla função, profissionais obreiros. Estas são algumas expressões usadas para definir o obreiro que além das atividades ministeriais, desenvolve alguma outra atividade profissional na sua comunidade.
Alguns tem assumido na prática este posicionamento e até defendem tal ponto ministerial. Outros, consideram uma afronta ao ministério pastoral tal atitude, para estes, aqueles que exercem a função pastoral titularmente e exercem ainda, outra forma de trabalho é considerado quase um herege.
É certo, porém, que não se pode ignorar que a Bíblia apresenta obreiros desenvolvendo funções ministeriais e pastorais de forma bivocacional, e diga-se, com muita eficiência. Comentando sobre este assunto, Craig Ott & Gene Wilson[1] ratifica que “O apóstolo Paulo trabalhou literalmente como um fazedor de tendas. Os missionários morávios – a maior força missionária de seu tempo – foram todos bivocacionados (Langton 1956; Ward 1992). Hoje, fazer tendas tem se tornado um fator significativo em missões, especialmente em locais de acesso criativo, nos quais os missionários tradicionais não conseguem vistos de permanência”.
De repente, alguém possa alegar que isso funciona muito bem para missões, mas, não para o pastorei de igrejas estabelecidas. A afirmativa pode ser verídica, entretanto, precisamos compreender, que, em se tratando de competências, o pastor ou o missionário tem as mesmas responsabilidades diante de Deus. Assim sendo, não se pode preterir um ministério e dar maior ênfase a outro.
Em tempos que tanto se fala em plantação de igrejas, percebe-se que um dos fatores que tem se tornado um grande entrave, diz respeito a sustento financeiro. Como manter uma estrutura pastoral para plantação quando as igrejas em sua maioria (sendo pequenas ou grandes) encontram-se em grandes desafios para manter suas próprias estruturas?
Partindo deste pressuposto, quero no presente artigo, defender a ideia de um ministério pastoral bivocacional, tenho completa convicção que não teremos unanimidade no tema, todavia, colocamos aqui um posicionamento que entendemos ser coerente. Obviamente que seguimos o raciocínio de alguns escritores para fundamentar nosso texto.

1 – Se o ministério bivocacional pode ser usado nos programas missionários, também pode ser usado em plantação e revitalização de igrejas locais.
Para Craig Ott & Gene Wilson, “A plantação de igrejas bivocacional é fundamental nas doutrinas do sacerdócio, ministério e exercício dos dons de todos os cristãos e se reflete na prática do Novo Testamento. Os movimentos de mobilização de leigos promovem o avanço da Grande Comissão e permitem que os pastores teologicamente treinados retornem à função de capacitadores descritas em Efésios 4.11-13. ”

2 – O ministério bivocacional aproxima o pastor da sociedade e de seu campo de trabalho.
Christian A. Schwarz[2] declara que quanto mais tempo de vida cristã e de igreja a pessoa tem, menos contato ela tem com os de fora. O mais curioso disso, acontece quando olhamos o desenho que ele coloca em sua pirâmide de contatos, o pastor, encontra-se no patamar mais alto, ou seja, mais distante da comunidade não cristã.
A grande maioria dos relacionamentos pastorais em sua comunidade se dar com os cristãos da igreja que pastoreia e cristãos da cidade. O ministério bivocacional produz esta oportunidade evangelística para o pastor. Ali, o pastor bivocacionado terá uma oportunidade de contato direto com o não cristão, podendo em tempo oportuno desenvolver seu trabalho pastoral na comunidade.

3 – O ministério bivocacional viabiliza a questão do sustento pastoral.
Em tempos de crise de manutenção pastoral para uma grande maioria, onde o poder de compra é absorvido imediatamente dos proventos pastorais, onde falar de aumento de prebenda muitas vezes é uma afronta aos ministérios locais e o pastor pode ser taxado como mercenário.
Sabendo ainda, que a família pastoral tem as mesmas necessidades das demais famílias, se faz necessário uma agregação financeira para estabilizar as finanças e proporcionar ao pastor e família uma estadia compatível com as demandas decorrentes do dia a dia da vida citadina.
Uma atividade profissional pode proporcionar isso ao pastoreio e facilitar um projeto de plantação. Ou cooperar na restauração de uma igreja em declínio.

4 -  O ministério bivocacional permite desenvolver um pastorei descentralizador.
Uma grande dificuldade encontrada por pastores de tempo integral ou não, é, fazer com que a igreja se envolva no processo de trabalho diário e desenvolvimento da igreja local.
De acordo com Rick Warren apud Dennis Bickers[3], “cinquenta por cento dos membros de todas as igrejas não se interessam em servir em nenhuma função”, o desafio aqui é elaborar um sistema intencional para mobilizar e apoiar o serviço dos membros nas tarefas diárias da igreja local.
O pastor bivocacional, vai focar seus esforços no treinamento e equipamento dos membros para desenvolverem o trabalho do Senhor em equipe e não de forma solitária. Geralmente, quando a igreja já recebe o pastor consciente de suas atividades extra igreja, ela é compreensiva para com ele. Outra realidade, é que, o pastor pode cobrar de seus líderes com conhecimento de causa, uma vez que, também lida e conhece as labutas diárias das atividades não ligadas ao mundo eclesiástico.
É interessante destacar, que assim como em todo empreendimento que desenvolvemos, existe dois lados. Aqui não é diferente. Existe perigos que rondam o pastor bivocacional.

1 - O perigo de servi a dois ou mais senhores: Para Craig Ott & Gene Wilson[4], “A preocupação imediata se torna como administrar efetivamente duas grandes vocações – mais o casamento e a família em muitos casos – e as múltiplas expectativas que vem com elas”.
O cuidado nestes casos precisa ser redobrado, saber administrar o descanso, períodos sabáticos, lidar com a questão da administração do tempo se torna algo indispensável. Aqui é sábio escutarmos Henry e Richard Blackaby apud Dennis Bickers:[5]

Os líderes mais ineficientes e improdutivos têm tanto tempo quanto os líderes que fizeram história. Cada um é constrangido pela necessidade de dormir, comer, exercitar-se e relacionar-se com a família. Todos enfrentam questões financeiras, circunstâncias imprevistas e pressões diárias. A diferença é que os líderes sábios recusam permitir que as exigências da vida controlem a agenda ou as prioridades. Os líderes insensatos sucumbem diante das pressões irrelevantes e tentações insignificantes que os cercam e nunca realizam tudo que Deus tem para eles. Os grandes líderes não permitem que as atividades da vida ou as muitas responsabilidades os subjuguem. Mais exatamente, eles se tornam senhores de suas agendas cheias através de esforço determinado e consciencioso.

 2 – Críticas severas de colegas, uma ameaça a carreira ministerial.
De acordo com Craig Ott & Gene Wilson[6], o obreiro bivocacional tem sua motivação prejudicada quando é tratado por seus colegas como um obreiro de segunda classe. Com isso, negando-lhe respeito, consideração e reconhecimento. Sendo assim, o ministro bivocacional precisa ter convicção de seu chamado e defende-lo, diante de qualquer um que lhe peça explicações sobre sua vocação.
O ministro bivocacional não pode estar no ministério só por conveniência, mas sim, por certeza do chamado, dessa forma, desenvolverá com eficiência a obra que lhe foi entregue a fazer.

Considerações
Diante do exposto, resta atentar para alguns conselhos. Se deseja desenvolver um ministério bivocacional, prepare-se bastante, este é um ministério para líderes fortes, determinados, não acomodados, exige coragem, saída da zona de conforto, flexibilidade, habilidade para múltiplas tarefas.
Entenda que não é qualquer trabalho que pode ser feito enquanto desenvolve os serviços ministeriais, saiba ser coerente com profissão e ministério, não vá apenas visando lucro.
Tenha um propósito claro ao iniciar um ministério bivocacional. Avalie sua chamada, observe se isso não será um entrave em sua vida ministerial, avalie sua capacidade resiliente, não faça no impulso ou por questões puramente egoísta.
Uma vez consciente de sua vocação, não tenha medo, siga em frente, avalie o tempo e aprenda a ouvir a Deus, cuidado para não sacrificar o desnecessário. A chamada de Deus é multiforme, assim como a sua graça sobre nós.

18-01-2019.


[1] Craig Ott & Gene Wilson. Plantação global de igrejas, Esperança, 2013p 323.
[2] Mais informações em: Christian A. Achwarz. Evangelização Básica, Esperança, 2011.
[3] Conciliando profissão e ministério. CPAD, Pg 96.
[4] Op. cit, p 326.
[5] Op. cit, p 105.
[6] Op. cit, p 327.

2 comentários:

  1. Muito bom Pr Reginaldo!
    Ultimamente tenho pensado que o melhor para o campo missionário e para igreja pequenas, sobretudo no interior, é o pastor que exerce um ministério bivocacional.
    Hoje estou trabalhando em uma plantação de igreja e estou partindo para este ministério bivocacional. A grande dificuldade é que a minha geração foi doutrinada de que você deveria ser de tempo integral, sem exceção. E aí vejo dois problemas:
    1. o jovem ser levado a deixar tudo, até mesmo o estudo secular superior, para ir para o seminário;
    2. não consolidar uma profissão ou o desenvolvimento de uma aptidão para exercer também como ministério.

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    1. você tem toda a razão meu companheiro.Ponto interessante esse que destacou:"2. não consolidar uma profissão ou o desenvolvimento de uma aptidão para exercer também como ministério." isso tem se mostrado trágico na vida de muitos.

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